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Não há melhor dita que ir à missa de domingo vestido de grave, em ares de janota, ouvir a palavra de Deus e a prática do nosso prior, e depois sair à rua de alma desenxovalhada, pronto a enfrentar as amarguras da vida.
Noutro tempo, quando a aldeia era aldeia, ao rabo da cerimónia juntavam-se os amigos no adro trocando larachas acerca do tempo e badalhocando na vida alheia. A bácora grande da ti Marzabel pariu uma dúzia de recos luzidios; ao Zé Birra embostaram-lhe o poço do horto; os Cabrais vão erguer choupana ao cimo do povo… Ali se laparchinava em descoberta das novidades.
Pela minha parte aproveitava para fazer a cobrança do que me era devido por alguns, aos quais fiara fazenda. Assim abordei de uma vez o Joaquim Tourais, questionando-o pela paga de um pano de chita que há muito lhe vendera.
– Não gosto de ser tinhoso, mas já é tempo de me pagares a mercadoria.
– Inda onte tive com os trinta mérreis na mão, de coisa feita em me botar a sua casa – disse-me ele de ar atarantado.
– Pois como lá não foste, aqui me tens pra receber a paga.
– O caso é que o damonho da minha Maria, que é de má laia, me rogara que lhe mercasse umas pitas pedreses, e tanto me azucrinou a cabeça que me cheguei ao ti Videira e lhe aprecei quatro das que tinha no poleiro.
Arreliei-me com aquela léria. O palonço de cada vez alanzoava sua laracha e não havia modo de me pagar a dívida.
– Primeiro cumpres a obrigação que tens para comigo, depois tratas das tramóias da tua… Agora toca de ir ao poleiro agasnatar as pitas, que as levarei de paga – disse-lhe já farto das suas escusas.
– Isso não ti Zé. Tenha dó! A minha desancava-me!
– Catano, e deixo que me ferres o cão? – berrei-lhe já arresinado, com os punhos cerrados, disposto a zurzir-lhe o pêlo.
– Não se aferrenhe, que o caso se remediará. Daqui a dias lhe pagarei, afianço-lho!
Virou costas e largou em passo estugado, temente que o maltratasse.
O Joaquim Tourais não era má peça. Seria até dos mais justos homens da Bismula. O mal era a bácora da mulher, que o abarcara já viúvo e lhe dera a volta ao tutano. Meteu-se-lhe de portas adentro a rogar homem maduro que lhe tirasse a cachondice, e toma, passados dias, o padre anunciava os proclames da atadura. Pôs-lhe a vida negra, o raio da cachopa. Fazia-o penar de patrão em patrão no ganho do jornal, que logo ela lhe surripiava do bolso quando chegava a casa estafado. Era ela quem marcava a ordenança, vivendo como reca cerrada em seu cortelho. O pobre Tourais, desorientado com a vida, tinha de pedir fiado para beber na taberna e mercar roupa com que se vestisse ao domingo e dias nomeados.
Que o rapaz era boa pessoa e aplicado trabalhador sabia-o de sobeja, que eu mesmo poria as mãos na lambra pela sua justeza, agora que me não pagasse a fazenda por mor das tinetas da mulher é que não podia permitir. O caso tinha de ser remediado, e dei por mim a malucar em como cobrar a dívida, pois o bagalhuço fazia-me falta para o andamento do negócio, e não me agradava que aquela zoupeira se estivesse a rir da trama. Sabia que a maldita tinha artes para a costura, e que houvera talhado e alinhavado uma chambra com a chita que ele me rogara. Eu mesmo já lha topara vestida num dia festivo. Ora, deixa ver, que o caso tem boa solução.
Num dia, ao fecho da tarde, dando fé de que o Tourais dava as ultimas cavadelas no chão onde ganhava a jorna, dispus-me a pôr fim ao caso. Chamei o meu Luís, catraio com ares de maltês, puxado à laia do pai, e dei-lhe instruções.
– Daqui a nada, quando te assobiar do fundo da rua, dás um salto à casa do ti Joaquim Tourais e dás recado à ti Maria para que corra à taberna que o homem se engolfou em vinho. Depois desandas para casa, como se de nada se tratasse. E nem chus nem mus, bico cerrado. Entendeste?
– Sim, meu pai!
– Então fica atento ao meu silvar.
E lá fui até ao cabo da ruela, onde soprei o assobio combinado. O rapaz arrancou que nem foguete a cumprir o que lhe ordenara. Olhei em redor para me certificar se alguém dera fé, mas não havia que ter cuidados, a populaça ainda labutava nos agros e o povo estava deserto. Saltei então para o acanhado curral do Tourais, onde me alapardei por detrás da moreia de lenha que estava a um canto. Num ai chegou o meu Luís, que berrou do meio da rua.
– Ó ti Maria! Ó ti Maria!
A calhandra assomou-se à porta da casa térrea, de pescoço vermelhão erguido, que nem perua no poleiro.
– Que queres, garoto?
– O ti Jaquim está lá abaixo na taberna emborrachado de todo. Nem se tem nas pernas. É melhor lá ir por ele.
– Ai o malvado, que o desanco!
E saiu a toda a pressa, atravessando o curral esbaforida. Tinha o caminho livre para fazer as minhas contas. A porta ficara escancarada, pelo que foi só entrar e correr à cata da arca da roupa, que encontrei na saleta, encostada ao tabuado. Abri-a e revolvi a farrapada até descobrir a chambra de chita rubra. Botei a mão ao que era meu, escondi-o debaixo da véstia e saí do casoto. Já em casa enfiei a gribalda no meio de outras fazendas, e segui com meus afazeres, satisfeito da vida.
No dia seguinte deu brado que a casa do Joaquim Tourais fora roubada. Já eu estava longe, no mercado de Alfaiates a vender fazendas, entre as quais uma vistosa blusa de chita encarnada.
Paulo Leitão Batista, «Aventuras de um velho contrabandista»
leitaobatista@gmail.com
As lojas maçónicas do Continente Europeu, todas elas de raiz francesa, sempre se caracterizaram como revolucionárias, antimonárquicas e ferozmente inimigas da Igreja Católica, particularmente das suas Hierarquias.
Tudo isto tem uma explicação.
Da Inglaterra, as lojas maçónicas passaram aos outros países, com uma dupla missão — alargar o seu campo de influência e potenciar o expansionismo britânico.
Ora, a grande rival do Reino Unido, continuava a ser a França, ao tempo a competir com ela nos Cinco Continentes.
As teorias dos enciclopedistas facilitavam o caminho.
Assim, Montesquieu e o Marquês de Sade foram iniciados na mesma tarde — dia dezasseis de Maio de 1730 – e na mesma loja — TAVERNE DE HORN, em Westminster.
O movimento tocava profundamente até o alto clero e a mais histórica aristocracia, que, inconscientemente e por uma questão de modas, estavam a potenciar uma queda que já se divisava.
O monarca, que, ao tempo, era Luís XV, desconfiava desta nova forma de associação de raiz britânica. Achava bizarro que os sócios das lojas cultivassem o secretismo, ou mesmo o mistério. E tenta combatê-la, luta difícil dado o secretismo da instituição, que só os irmãos tidos como absolutamente seguros, dominavam.
E de sucesso em sucesso, o movimento cria o GRANDE ORIENTE, dominado por Voltaire. A ideia continua em expansão e chega às familias reais aderentes ao protestantismo que viam nela um poderoso instrumento de luta contra a Igreja Católica, cujos bens queriam confiscar.
Foi o caso do imperador sueco Gustavo Adolfo e de vários dos cerca de quinhentos príncipes alemães, que pretendiam reforçar os seus erários, naturalmente magros pela pequena dimensão dos seus estados com os patrimónios objecto de confisco.
Reexaminando o caso francês, veremos que a Revolução de 1789, a histórica Revolução Francesa, foi basicamente uma vitória do GRANDE ORIENTE e, em particular, da LOJA DOS SETE IRMÃOS.
O primeiro círculo republicano na França foi a loja LA BOUCHE DE FER.
Era contra o Rei e a Igreja que os maçons lutavam, esperando apenas o momento favorával para derrubar o trono e o altar.
E a sua implantação avançara tanto que nos ESTADOS GERAIS de 1789, dos seiscentos e cinco representantes do TERCEIRO ESTADO, dito POVO, quatrocentos e setenta e sete eram franco-maçons.
A Inglaterra parecia ter razões para estar contente.
Caída a Monarquia, a França iria cair em sucessivas convulsões e deixaria de poder apresentar-se como competidora no domínio do Mundo.
Mas com a irrupção do Bonapartismo irfa pagar caro a exportação do credo maçónico.
«Politique d’ Abbord – Reflexões de um Politólogo», opinião de Manuel Leal Freire
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