José Robalo – «Páginas Interiores»Longe vai o tempo e com alguma nostalgia recordo a carrinha da Gulbenkian, uma biblioteca itinerante que periodicamente nos cultivava e combatia o isolamento em que nos encontrávamos no final da década de 60 do século passado. Foi através dessa biblioteca itinerante, que fui tendo acesso a livros que me prenderam e viciaram para sempre como leitor.

Carrinha Itinerante da Gulbenkian

Nesse primeiro embate com a leitura, descobri e aprendi a gostar de dois grandes autores portugueses e verdadeiros artesãos da língua portuguesa: Camilo Castelo Branco e Aquilino Ribeiro. A leitura destes dois mestres da narrativa apetrecha-nos com as ferramentas essenciais para o domínio da nossa língua.
Estamos no Natal!
Foi nesta época de sonhos fixos na chaminé por onde descia o Menino Jesus, que num desses natais li duas histórias que nunca mais esqueci: O Romance da Raposa e O Malhadinhas de Aquilino Ribeiro. Era o tempo em que o mundo ainda não andava torto.
Num qualquer lugar das Beiras, recolhidos do frio e à lareira, ler o Malhadinhas é reencontrar o retrato físico e psicológico do almocreve beirão, que percorria as nossas aldeias, temperado pela malícia da vida danada e madrasta. Ficamos ainda a saber que o nosso herói, numa das suas aventuras se recolheu à sua fazenda do Sabugal, quando Aquilino nos diz: «Acolhi-me à minha fazenda do Sabugal com reiuna bem escorvada.»
Se o caro amigo leitor não tiver tempo para a leitura de toda a narrativa aconselho-o a percorrer o capítulo IX, onde o nosso herói, tem um encontro com a neve e os lobos, acompanhado por um frade.
Será possível recuperar a democratização da cultura, com uma biblioteca itinerante?
Boas leituras e um Feliz e Santo Natal.

:: :: PARA LER :: ::
«O Romance da Raposa», de Aquilino Ribeiro, Livraria Bertrand.
«O Malhadinhas», de Aquilino Ribeiro, Livraria Bertrand.

:: :: PARA OUVIR :: ::
«Beck : Sea Change», Geffen.
«Concertos para piano, nº 24, 25, 26 e 27 de Mozart, Berliner Philarmoniker», tendo como solista Daniel Barenboim, Teldec.

«Páginas Interiores» opinião de José Robalo
joserobaload@gmail.com