Fomos ao Alentejo em ronda pelas terras próximas de Estremoz, numa roda de amigos. Ao cabo aportámos nos Arcos, terra próxima de Estremoz, para visitarmos a tasca do Ti Gato, afamada pelo vinho fermentado nas talhas antigas, que orgulhosamente ostenta no estabelecimento.

As talhas de barroChegámos ao final da tarde, já lusco-fusco. Desconhecendo onde quedava a tasca, abordámos um habitante, que nos zelosamente nos conduziu a uma casa de um só piso, de frontaria caiada, com ares de habitação, sem nada que assinalasse uma taberna. Lá dentro verificámos que um velho armazém fora adaptado à função de taberna e adega, com uma fila de talhas à direita e um pequeno balcão improvisado do lado esquerdo.
Dada a salvação aos presentes, dirigimo-nos ao senhor que estava por detrás do balcão, acompanhado pela mulher, ambos já bem entrados na idade, e dissemos-lhe que vínhamos de longe, à cata do vinho da talha e de um bom petisco.
– Produzo e vendo o melhor vinho da talha da região, quanto a petiscos têm de falar com a patroa.
Empunhando uma jarra o José Joaquim Gato, que era o nome do taberneiro, dirigiu-se a uma das dez talhas que tinha encarreiradas junto à parede, abriu a torneira de madeira colocada na base e fez correr vinho para a vasilha.
Joaquim José GatoSentados à roda de uma pequena mesa, deborcámos copinhos de tinto, engolimos três queijinhos secos e uma travessa de chouriças e cacholeiras cozidas, acompanhadas por um casqueiro alentejano.
Apreciámos esse vinho artesanal feito nas talhas de barro, seguindo técnicas ancestrais. As uvas são esmagadas e colocadas nas talhas, onde fermentam, produzindo o apreciado néctar. No tocante a castas, predomina a trincadeira, com algum aragonez e alicante. Depois de formado descobre-se, no dizer dos especialistas, um vinho jovem e macio, com ligeira adstringência, muito frutado e maduro, com taninhos suaves e persistência no final da prova.
Já a noite ia adiantada quando saímos da taberna e fomos visitar a casa mãe dos Gatos, do outro lado da rua, onde o irmão de Joaquim José, o António Gato, mantém a taberna antiga, herdada do pai. Demos com uma tasca típica, com talhas ao redor das paredes, mesas e balcão de madeira encimados com pedras de mármore. Apenas o Ti António Gato estava no estabelecimento, arrumando a casa, em sinal que estava na hora do fecho.
A prensa e as talhas na adegaA um canto, sobre um móvel alto, roncava um aparelho de televisão, que apresentava riscos no ecrã, sem que nada se apercebesse da imagem. Vendo-nos olhar admirados para o aparelho, achou por bem esclarecer:
– Está escangalhada. Não tem a imagem, mas para mim serve, só quero ouvir as notícias.
Ainda ali bebemos uma rodada, enquanto o homem nos explicou o processo de fabrico do vinho, desde o esmagamento das uvas, até à fermentação e à abertura das talhas. Espreitámos a boca dos potes e fomos conduzidos à adega antiga, onde havia talhas antiquíssimas, uma delas com o ano 1660 gravado no barro.
Vale bem a pena ir ao Alentejo observar as longas campinas, visitar as aldeias e as vilas prenhes de monumentos e desaguar nos Arcos, para ali provar o apreciado vinho da talha produzido pelos irmãos Gato, que persistem em defender a tradição local.
plb