Para apresentarmos o ensaísta, dramaturgo e jornalista Lapas de Gusmão, temos de recorrer ao maior estudioso da vida e obra dos homens ilustres de Riba Côa, J. Pinharanda Gomes e ao que escreveu no seu «Dicionário de Escritores do Distrito da Guarda» publicado em 1969.

O livro de Lapas de GusmãoNascido em Aldeia da Ponte, em 1886, Lapas de Gusmão partiu de casa para ingressar no seminário, onde completou os estudos teológicos. Optou por sair antes de ser ordenado sacerdote, e ingressou na carreira militar. Esteve em Angola durante um ano, sendo depois destacado para França, em 1917, integrando o Corpo Expedicionário Português, onde combateu. De regresso à Pátria manteve-se como oficial do exército até 1938, altura em que passou à reserva com a patente de capitão. Faleceu em Lisboa, no ano de 1962.
Para além da vida militar, foi jornalista, colaborando em diversos periódicos: A Pátria, Capital, Luta, Diário de Notícias, de entre outros. Com este último teve uma ligação muito forte, chegando mesmo a integrar o corpo redactorial. Noutra vertente, destacou-se como escritor e publicista, dando à estampa meia dúzia de livros de ensaio, dramaturgia e narrativa.
Apenas numa obra Lapas de Gusmão se referiu explicitamente à sua terra natal. Foi em «Uma Noite», pequena «tragédia rústica», como ele mesmo lhe chamou, em subtítulo, publicada em Lisboa, em 1928. De tão pequenina, a peça não mereceu edição própria, saindo em volume com uma primeira, intitulada «O Mutilado». O livro ficou dedicado à memória do tio do autor, o padre António Filipe Gusmão, que foi pároco de Alfaiates.
Quando publicou a tragédia, de um só acto, pensava que a mesma tinha qualidade suficiente para ir ao palco, contudo, descrente, acreditava que nunca a conseguiria ver representada, o que de facto nunca aconteceu.
O cenário descrito é um casebre lúgubre, moradia de pastores, com um janelo a botar para um rio, cujas águas em cachoeira soam em permanência. Há um mobiliário simples, com os utensílios tradicionais e estampas da Virgem e de outros Santos na parede. A cena é vagamente alumiada pelo luar que entra da pequena abertura. No triste e cru cenário evoluem as três únicas personagens do drama: Clara, João e Manoel. Clara entra em cena: deixou o filhinho (de meses) a dormir no quarto, vai ao janelo mirar o rio cachoando e consome-se num mau pressentimento. Alguém bate à porta. Entra Manoel, que a rapariga recebe ufana. Estabelece-se um longo diálogo, de onde se percebe que são amantes. Mas o terror instala-se quando se ouvem pancadas na porta, é João, o marido, que regressa a casa. A cena fica violenta e tem o seu epílogo com o choro dramático da criança que acaba de ficar órfã.
Como se disse a peça nunca foi ao palco. Porque não recuperar o texto e representar o drama, que se passou nas nossas terras raianas? Talvez o grupo de teatro Guardiões da Lua, da Quarta-Feira, que tantas provas de dinâmica tem dado ao concelho do Sabugal, possa aceitar o desafio, encenando e colocando a cena em palco, assim se promovendo a necessária homenagem ao dramaturgo Lapas de Gusmão.
plb