A Galeria de Arte do Casino Estoril recebeu entre 16 de Junho e 11 de Julho de 2007 a exposição «O jardim da memória involuntária» da pintora sabugalense Helena Liz. Fomos até lá e estivemos à fala com a ilustre artista raiana.

À fala com… Helena LizÀ hora combinada tinhamos à nossa espera na Galeria de Arte do Casino Estoril a pintora Helena Liz e o marido António Liz Dias. E há dias de sorte. Tivemos o privilégio de ser guiados, com muita simpatia, pela autora ao longo das paredes brancas que faziam sobressair as telas de tons calmos conjugados com vermelhos vivos.
A pintora Helena Liz nasceu no Sabugal. Filha de Fitz Quintela, funcionário da Câmara, sempre gostou de pintar desde pequenina. Antes de frequentar o Colégio do Sabugal despertou para a pintura com Eduarda Lapa uma amiga da família. «Era uma senhora de idade que pintava e que nos visitava na nossa casa no Sabugal», recorda a pintora «mas foi o meu professor, o doutor Rui Agonia Pereira, que me estimulou a pintar em aguarelas e que me surpreendeu com a sua visita a esta exposição».
– O que recorda do Sabugal?
– No dia da inauguração tive a surpresa de ver a Talinha e a dona Lurdes que tinha um café onde ia o meu pai. Vieram-me à memória os cheiros da minha meninice, os cheiros das giestas e dos sabugueiros, o cheiro da nossa terra, um cheiro forte.
– O que sente em Madrid?
– Sinto-me bem. Nasci na Raia e, por isso, sempre falei espanhol. Os meus brinquedos e as minhas bonecas eram comprados, bem perto, do outro lado da fronteira. Agora Madrid é a minha cidade. Respira dinamismo e vida por todo o lado. Todos os meses vou ao Prado. É um dos museus mais intensos do Mundo.
Vive desde 1970 em Madrid, feliz, casada com António Liz Dias, economista, delegado do ICEP na embaixada de Portugal em Espanha, mãe de uma filha e avó de dois netos. «Duas vidas que começam!» exclama assumindo com alegria o papel de avó.
Helena Liz– E como sente o chamamento da tela?
– Sempre gostei de pintar desde pequena. Já em Espanha estudei durante dez anos no IADE e tive a sorte de ser aluna de dois grandes pintores espanhóis, Lucio Muñoz e Amalia Avia. Comecei a trabalhar profissionalmente em 1975.
Os seus apreciadores são gente diversa. Já expôs em galerias portuguesas (incluindo a Galeria Sabugal, da Casa do Concelho em Lisboa) e espanholas, na China, em Macau, na Bélgica… «Nunca tinha ido a África. Fui ao Maputo em 1999 com uma exposição. E não esqueço aquela na Casa da Cultura da Guarda onde foram extremamente agradáveis. Há uma exposição colectiva itinerante de Picasso que anda por Espanha e França que inclui quadros meus»
– Explique-nos como decorre a criação de um quadro…
– Preciso voltar a sentir a necessidade de pintar um quadro. Preciso de sentir o desafio. Só se deve falar quando se tem alguma coisa para comunicar. Esta é a minha maneira de falar. Tanto estou sem pintar nada como estou a pintar vários quadros ao mesmo tempo. Começo uma série com três cavaletes. Depois há um quadro que me está a chamar e depois outro e depois outro… Quando tenho uma série coerente faço uma exposição. Há uma coisa que me agrada. Que os jovens gostem dos meus quadros. O «Groucho» e «A Lagosta» são de particulares que têm mais do que um quadro meu.
– Como é a sua sensação de se separar de um quadro?
– Não lhe sinto a falta porque vai permitir que pinte outro. Um quadro é potencial de energia que se esgota quando está terminado. Quando um dia terminar uma tela e disser – Este é o quadro da minha vida! – deixo de pintar.
A artista gosta de quadros que continuam, inacabados… que obriguem o visitante a descobrir, a pensar e a dar-lhe um final. Quase sempre um final feliz. E Helena Liz fica feliz nesta eterna busca do fim, da saída do labirinto. E porquê? Porque não gosto do perfeccionismo. Gosto da espontaneidade. O fim do labirinto será sempre a tentativa de Helena Liz se conhecer melhor porque a pintura é a forma sublime do conhecimento.
– Quem olha um quadro meu deve participar nele, deve acrescentar a sua própria história. Deve rever-se nele. Sentir e ler alguns momentos da sua vida. Quero que a minha obra incomode. Estes quadros têm mais que uma leitura. Têm mais que uma vida. Um quadro não está acabado. O espectador é que o acaba à sua maneira. A história termina com a interpretação do espectador.
A vida proporciona-nos estar sempre a aprender. Porque como diz Helena Liz agora está na idade de aprender a ser avó, a ver a vida com outros olhos. Rever e voltar à infância na vivência com os netos «que nasceram em Espanha mas que comigo vão falar em português» garante a «nossa» pintora.
jcl