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Era a brincar, mas ia saindo a sério. Um sapateiro do Casteleiro, meio com os copos, meio na paródia, tinha o hábito de fazer esse número de expulsar os diabos do corpo imaginário de uma vítima… Mas havia quem acreditasse e depois lhe pedisse mesmo que o fizesse a sério… e ele fazia.
O Ti’ Luís Pinto era sapateiro. Um homem muito bem disposto, muito alegre, dentro dos padrões de uma aldeia isolada dos idos de 50 – década de 50 do século XX: lá por alturas de 1950 e poucos.
Era uma pessoa cheia de problemas mas que os vencia por recurso a dois patamares de comportamento: por um lado, enfrascava-se nas tascas até mais não; por outro, de tudo fazia uma brincadeira.
A miudagem adorava passar lá uns minutos na sua lojita de sapateiro, a ouvir as histórias e as brincadeiras de alguém já velho (devia ter aí uns quarenta anos – velhíssimo).
Também fazia de «espírita»
A Praça era no Casteleiro desse tempo um dos largos mais frequentados, sobretudo aos domingos à hora de missa (cada um ficava na Praça pelas suas razões, mas da parte masculina de certeza que ver as beldades era razão suficiente).
Nos dias de semana, a Praça também tinha gente, sobretudo ao fim da tarde.
A casa e sapataria do Ti’ Luís Pinto era a menos de 50 metros da Praça.
Como se sabe, nas aldeias desse tempo, ir à tasca beber um copo (um??) era o equivalente a ir tomar um café ali à esquina nos dias de hoje.
O Ti’ Luís Pinto também. E muito. E muitas vezes. E muitos copos.
Na paródia, em certas tardes talvez já bem bebidito (como era habitual), fazia teatro: imaginava um possesso do diabo ali mesmo e procedia ao exorcismo.
Ou seja: a brincar, expulsava o demónio daquele corpo.
E fazia isso com uma lenga-lenga por todos apreciada:
Foge daí,
Espírito mau.
Lagarto, lagartixa, lacrau.
Eu tenho aqui um pau.
(Batia três vezes com o pau no chão: Pum! Pum! Pum!)
Conforme entraste
P’rò corpo deste infeliz,
Assim hás-de sair,
Nem que seja pelo nariz.
(Pum! Pum! Pum!)
Com ossos de defunto,
Um bocado de presunto,
Cinco réis de mel coado,
Um paninho bem molhado,
Óleo de noz,
Borras de algeroz,
Azeitonas de cabrito,
Línguas de periquito,
Eu te afugento,
Rabugento,
Para onde não haja
Nem ar,
Nem rei nem roque,
Nem eira nem beira,
Nem pipas,
Nem batoque,
Nem gatas aluadas.
(Pum! Pum! Pum!)
O teatro da expulsão do diabo de um corpo ficava feito. Só que o Ti’ Luís Pinto começou a ganhar a fama… e sabemos como isso é contagioso nas aldeias.
Havia depois pessoas que à socapa lá iam a casa pedir-lhe o favor de expulsar o mafarrico que lhes tinha tomado conta do corpo. Ele tentava desmobilizar a coisa e dizia que era tudo uma brincadeira dele. Mas as pessoas insistiam.
Então, malandreco, o Ti’ Luís Pinto lá fazia o jeito.
E parece que o trabalhinho era bem feito – pois nunca se ouviu falar de qualquer reclamação!
Nota:
À falta de melhor, ilustra-se este texto com uma foto do Festival das Bruxas de Vilar de Perdizes.
«A Minha Aldeia», crónica de José Carlos Mendes
Procurarei com este texto, no Dia Mundial do Teatro, que acontece hoje, 27 de Março, prestar uma homenagem a todos aqueles que com o seu trabalho dinâmico, sabedoria, empenho e talento na arte de representar, que proporcionam tantos momentos culturais e emocionais a um público que os admira e respeita.
Viver é representar. Todos os homens escolhem as melhores máscaras e saltam para ao palco do teatro com engenhosas representações.
Shakespeare dizia que o mundo era um palco e Fernando Pessoa definia-se como uma cena viva representando diversos actores em diversas peças. Assim se explica a fome de teatro de todos os homens. A Vida é um Teatro. Experimentem, por exemplo, tirar todas as máscaras nos sectores políticos, religiosos, sociais e culturais, e, que outra consequência senão encontrar a morte? Com efeito, é o Teatro que torna as pessoas mais livres e permite a vida, ora autorizando verdades que, sem máscara, poucos ousariam dizer, ora dissimulando os nossos reais defeitos e possibilitando a sã convivência.
O teatro vem dos clássicos gregos, atravessa séculos de culturas e civilizações, passa pelo misticismo, pela farsa social, pelos testemunhos heróicos, religiosos e tantos outros. A sua importância é milenar. Nas tragédias gregas, por exemplo, as autoridades pagavam ao próprio público para as ir ver.
Quando Molière bateu três vezes com a sua bengala nas «tábuas da aristocracia francesa» do Século XVII, não imaginaria, por certo, que esses sons ecoariam numa aldeia portuguesa recôndita, situada no Planalto do Ribacôa, na alma do POVO anónimo Bismulense, a que com orgulho pertenço, e que escolheu para acontecer Teatro representado em diversos locais públicos: o Largo de Santa Bárbara, da Relva, da Praça, e quando o tempo ameaçava chuva no Salão, ao cimo da Rua do Forno.
Através de um conhecimento baseado na transmissão oral, nos princípios do Século XX já a Bismula fantasiava um jogo cénico com componentes militares e religiosas, envolvente ao Mártir São Sebastião, que já abordei num texto sobre a Irmandade com o mesmo nome, centenária e com irmãos espalhados por todas as freguesias do Concelho do Sabugal.
Com a nomeação do Padre Ezequiel Augusto Marcos para Pároco da Bismula e ali residente, as peças de Teatro levadas à cena atingiram o seu apogeu, contando com o apoio de dois colaboradores e encenadores: José Joaquim Fernandes e o seu parente José Maria Fernandes Monteiro, seguidos por um elenco de actores populares, que hoje envergonhariam muitas vedetas de pacotilha, que aparecem todos os dias nos ecrãs da televisão. Actores de grande talento como Joaquim Firmino, António e Joaquim Videira, Iberte Alves Ramos, José Augusto Vaz, Paulo Cardoso, José Maria Fernandes, Manuel José Fernandes, as Irmãs Faustina, Trindade e Inês Alves Mendes, Maria Bernardete Fernandes Lavajo, António Joaquim Lopes, Antero Leal, Francisco dos Santos Vaz, e tantos outros.
Esta plêiade de homens e mulheres levaram à cena, na Bismula e nalgumas freguesias limítrofes, peças de Teatro com a temática religiosa, histórica e alguma mitologia popular; no final havia sempre uma rábula cómica, que fazia rir o grande público. Para dar um ar festivo ao Teatro, muitas vezes este era abrilhantado por uma Banda de Música, que vinha da Freguesia da Malhada Sorda ou da Parada.
Lembro-me da apresentação das peças de S. Sebastião, «A Bandeira Roubada», «Santo Tarcísio», «Os Dois Jovens Cativos», «A Paixão de Jesus Cristo», «Restauração de Portugal», «O Amor Descoberto», «O Fim do Mundo»; nas peças mais cómicas apareceram «O Barbeiro de Sevilha», «Salsa e Parrilha» e outras que não tenho na memória.
Estas peças eram apresentadas com tanto realismo que numa peça, levada à cena no Largo da Relva, com o palco assente nas pedras do mercado (já desapareceu este património), um dos actores ficou com uma costela partida. Também não posso deixar de dar o meu testemunho pessoal. Na peça «A Bandeira Roubada», o meu pai é condenado à morte e com os meus seis anos comecei a chorar compulsivamente no meio dos espectadores, e só parei quando me agarrei ao pescoço do meu saudoso Pai – José Maria Fernandes Monteiro – e confirmei que estava vivo e não tinha sido morto.
Vivi esta e outras emoções que me acompanham até à morte. Devo-as ao Povo Actor, aos Homens e Mulheres Bismulenses.
HONRA, GLÓRIA E LOUVOR AOS ACTORES ANÓNIMOS BISMULENSES, CUJOS NOMES AINDA ESTÃO VIVOS NA MEMÓRIA DE TODOS AQUELES, QUE ASSISTIRAM A MARAVILHOSAS PEÇAS DE TEATRO.
A TODOS OS HOMENS DO TEATRO.
António Alves Fernandes – Aldeia de Joanes
Começou o Teatro de Outono, ciclo de espetáculos de teatro organizado pela Agência da Guarda da Fundação INATEL, em colaboração com autarquias e associações locais.
O primeiro espectáculo decorre no dia 15 de Outubro, na cidade de Pinhel, com a peça «A vingança de Antero», pelo grupo de teatro Ultimacto – Cem Soldos – Tomar. O espectáculo terá lugar no Cine-Teatro S. Luís, com início marcado para as 21H30.
O INATEL tem organizado no quarto trimestre de cada ano, no distrito da Guarda, o Teatro de Outono, ciclo de espectáculos que pretende divulgar as produções dos grupos teatrais do distrito da Guarda e dos distritos da zona centro.
Este ano retoma-se o mesmo ciclo com 12 propostas de espectáculo diferentes envolvendo nove grupos, quatro dos quais do distrito da Guarda (Teatro Experimental de Mortágua, Teatro Olimpo, Ultimacto, A Cartola, Loucomotiva, Aquilo Teatro, Teatro do Imaginário, Grup’Arte, Guardiões da Lua). Deste modo, as autarquias e associações contratam espectáculos aos grupos entre 1 de Outubro e 31 de Dezembro, funcionando a Agência da Guarda da Fundação INATEL como mediadora na aquisição de espectáculos e comparticipante nos custos.
plb (com Agência da Guarda da INATEL)
Vai ser recriada uma «Feira Republicana» em Oliveira do Hospital integrada no programa da XIX Feira do Queijo Serra da Estrela e no âmbito das comemorações do Centenário da República promovidas pela Câmara Municipal local. A Feira encerra com XXI Capítulo da Confraria do Queijo Serra da Estrela em Vila Pouca da Beira.
O grupo teatral Vivarte vai recriação de uma feira republicana dos inícios do século XX. A encenação integra o programa da XIX Feira do Queijo Serra da Estrela e Outros Produtos de Qualidade.
Em declarações à agência Lusa, Glória de Jesus, porta-voz do grupo de teatro esclareceu que «o espectáculo inclui jogos populares, duelos de sabre, cantigas ao desafio, partida dos rebanhos para os pastos de transumância, recriação dos desacatos por via do fiscal dos isqueiros de pedreneira e danças tradicionais».
Será feita a leitura do jornal «O Século», com as novidades de Lisboa e a mobilização para a Flandres e a recriação das figuras do fotógrafo da capital e dos vendedores da «banha da cobra».
A XIX Feira do Queijo Serra da Estrela e outros Produtos de Qualidade conta com a visita do secretário de Estado das Florestas e Desenvolvimento Rural, Rui Barreiro, uma mostra da tosquia das ovelhas Serra da Estrela e um desfile da Confraria do Queijo Serra da Estrela e de outras confrarias convidadas onde se inclui a Confraria do Bucho Raiano do Sabugal que marcará presença com alguns confrades trajados a rigor.
A feira encerra com a realização do XXI Capítulo da Confraria do Queijo Serra da Estrela, na Pousada do Desagravo, em Vila Pouca da Beira.
jcl
Como leigo nestas coisas da literatura e perdoem-me os entendidos, desde que conheci e li Gil Vicente, sempre pensei que este dramaturgo nasceu nas terras da Riba Côa.
Muy graciosa es la doncella
Muy graciosa es la doncella,
cómo es bella y hermosa!
Digas tú, el marinero
que en las naves vivías
si la nave o la vela o la estrella
es tan bella.
Digas tú, el caballero
que las armas vestías,
si el caballo o las armas o la guerra
es tan bella.
Digas tú, pastorcito
que el ganadico guardas,
si el ganado o los valles o la sierra
es tan bella.
Gil Vicente
Este poema de amor do nosso Gil Vicente foi extraído de «Uma antologia de las mejores poesias de amor en lengua española de Luís Maria Anson», da Plaza Janés.
Desconhecendo-se como se desconhece a data e local de nascimento por inexistência de elementos, nada melhor do que percorrer a sua obra e concluir que pelos indícios e conhecimentos que o autor tinha dos hábitos, maneiras de pensar e agir das gentes beirãs, este nasceu e passou grande parte da sua vida na Beira.
Em primeiro lugar, nos tipos que criou de forma superior, nomeadamente o lavrador, o pobre e humilde beirão foi sempre tratado com muito afecto nas suas obras.
Gil Vicente não era um homem da côrte! Foi estudante em Salamanca!
O seu domínio do castelhano (recorde-se que estamos perante um escritor bilingue), mais próximo do reino de Leão, mais ratifica a minha ideia de que este autor foi nosso antepassado nas terras da Riba Côa. Ainda hoje é normal que um raiano domine o castelhano falado, o que não acontece no restante território nacional. É ainda verdade que mestre Gil Vicente mesmo quando escrevia em português arcaico, utilizava com frequência o castelhano, por vezes até corrompido para reforçar o cómico, o que evidencia um excelente domínio desta língua.
Na actualidade os nossos agricultores continuam a ir à feira de Trancoso, facto que o autor referiu ao longo das suas obras.
Estou convencido que se tivéssemos o cuidado de investigar esta temática na Torre do Tombo, talvez se retirassem conclusões muito interessantes, trabalho a desenvolver por especialistas.
Por outro lado, o nosso auditório que serve também para a representação teatral poderia ter o nome deste dramaturgo, considerado «o pai do teatro português».
:: :: PARA LER :: ::
«Quem tem farelos» e «Floresta de Enganos», de Gil Vicente.
:: :: PARA OUVIR :: ::
«St. Elsewhere», por Gnarls Barkley (em especial o tema Crazy).
«Páginas Interiores» opinião de José Robalo
joserobaload@gmail.com
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