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Conta-se que há longo tempo, certamente há mais de um século, o Faleiro era uma terra grada e muito promissora. O tempo áureo há muito que passou e hoje é a aldeia fantasma do concelho do Sabugal, para a qual importa encontrar um destino alternativo ao desmoronamento total daquilo que dela resta.
Embora anexa da Bismula, que em si era aldeia imponente, o Faleiro conseguia ter expressão própria. Situado numa ligeira encosta, virado a Poente, era sobretudo um aglomerado de gente que vivia da lavoura.
Os habitantes exploravam as terras férteis, especialmente as veigas das margens da ribeira de Alfaiates, que lhe passa a poucas centenas de metros. Havia gado vacum, ovino e caprino, que conferia bons rendimentos. Do Faleiro também saíram homens para o contrabando. Consta que havia ali cargueiros varudos, de força viva e pé ligeiro, sempre prontos a juntarem-se aos rapazes das terras vizinhas, da Bismula, Escabralhado e Rebolosa, para cruzarem a raia nas noites de breu.
A aldeia terá chegado a possuir dez juntas de vacas de trabalho e meia dúzia de pastorias, sendo por isso terra de potencial.
Enigmaticamente, sem que ninguém encontrasse uma razão forte, o Faleiro viu-se, aos poucos, reduzido de gente. Algumas famílias procuraram as terras vizinhas, onde teriam raízes, e as quintas ficaram reduzidas a meia dúzia de casais, dando lugar a uma terreóla pequena e pobre. Com o correr dos tempos, a situação agravou-se. A juventude foi em busca de longes paragens, seguindo na aventura da emigração, e os velhos foram definhando. As antigas casas de lavoura foram ficando ao abandono, até que todos as deixaram de vez, uns pela morte, outros porque optaram por ir para os lares de idosos, alguns porque se sentiram sós e procuraram companhia nas casas de familiares. O último resistente saiu dali há meia dúzia de anos, largando a também derradeira casa de lavoura da aldeia.
Hoje o Faleiro é uma povoação fantasma, desprovida de gente, colosso de casas velhas ameaçando ruína. As habitações são bons exemplos da antiga arquitectura beirã. Paredes grossas, erigidas com grandes pedras de granito, janelas pequenas, telha de canudo, são as características comuns a todas elas. Algumas apresentam os característicos currais fronteiros, onde se recolhia o carro das vacas e as alfaias da lavoura. No térreo das casas estão as lojas que acolhiam os animais e os celeiros onde se formavam as tulhas com as colheitas. Para acesso ao piso cimeiro há uma escadaria de pedra, que termina no típico balcão ou patim, que era uma espécie de patamar.
Este destino atroz do Faleiro é o possível caminho de outras terras raianas, que também primam pela pequenez. Com o rodar do tempo as casas vão ficando desabitadas, as gentes que teimam em resistir vão envelhecendo e, num ápice, o despovoamento total pode acontecer.
Como fazer reviver o Faleiro? Será impossível que novos colonos ocupem as velhas habitações e recultivem os campos. Mas pode haver lugar a projectos de recuperação da aldeia para fins turísticos. Reconstruir as casas deixando-lhe a traça antiga, instalar comodidades no seu interior, recriar os objectos da lavoura, realojar animais domésticos, recuperar o carro das vacas e demais alfaias da lavoura. Numa palavra, fazer do local um museu vivo ou uma quinta pedagógica, voltado para a recepção de pessoas interessadas em passar um período de sossego, no puro contacto com a Natureza e com vista para os modos de vida de antigamente.
Um projecto isolado para os Casais do Faleiro não será viável, mas um plano integrado de recuperação de casas em várias aldeias para turismo rural, em paralelo com campanhas de promoção das nossas terras enquanto destino turístico no interior do país, poderão dar alguma esperança.
«Contraponto», opinião de Paulo Leitão Batista
leitaobatista@gmail.com
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