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O Sport Lisboa e Benfica é o campeão Nacional da época 2009-2010 da Liga Profissional de Futebol portuguesa. A conquista do 32.º título foi comemorado no Estádio da Luz, perante mais de 64 mil adeptos, logo após o final do jogo com o Rio Ave que os encarnados venceram por 2-1. O avançado benfiquista Oscar Cardozo foi o melhor marcador da Liga portuguesa com 26 golos.


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Depois de alguns anos desencontrado, voltei a ter o grato prazer da companhia do ilustre escritor sortelhense Vítor Pereira Neves. O reencontro ficou marcado por uma memorável viagem ao Alentejo, por onde andámos numa jornada completa, com o historiador e investigador a servir de guia por entre os vestígios do nosso passado longínquo.
De Lisboa a Évora é uma hora de caminho, por auto-estrada. Ainda Vítor Pereira Neves explicava a origem dos montados e a razão de tanta terra de pousio, quando atingimos as imediações da cidade. Tomamos uma via à direita e seguimos até Guadalupe e depois para Valverde, em cujas proximidades visitámos a Anta do Zambujeiro, um monumento fúnebre de grande imponência.
No Período Neolítico, que corresponde aquele em que o monumento foi construído, os grandes chefes militares eram sepultados no interior de antas. As explicações vêm de quem conhece, e aqui impera a sabedoria do Dr Pereira Neves: «Escolhiam sempre uma encosta voltada a Nascente e o monumento era erguido em local próximo de uma linha de água. Colocavam ao alto esteios enormes, com vários metros, que eram encimados por uma grande laje, que assentava em forma de chapéu. Após cerimónia fúnebre, era costume cobrir o jazigo com cascalho e depois com uma camada de terra, fazendo com que tomasse a forma de um monte, ou de mamão, ou mama».
A Anta do Zambujeiro estava originalmente soterrada, sendo identificada devido à erosão, que colocou a descoberto as pedras do monumento. Uma exploração desenvolvida por estudantes de arqueologia permitiu identificar o monumento, tornando-o depois um grande atractivo da região.
Pereira Neves não está satisfeito. O monumento está ao abandono, mantendo ainda um velho telheiro que foi erguido provisoriamente aquando das explorações. «Quanta gente do mundo inteiro aqui viria ao Alentejo, se soubéssemos preservar vestígios históricos como estes e criar condições para que as pessoas os visitem?» perguntou o historiador com ar de desalento.
Ao almoço abancámos no restaurante Ricardo, em Valverde, onde degustámos a excelência gastronómica desta época no Alentejo: o borrego assado no forno, regado por um bom vinho de Estremoz.
Após a refeição voltámos a Guadalupe, e dali, seguindo por caminho antigo, alcançamos o conhecido Cromeleque dos Almendres ou do Alto das Pedras Talhas, situado no cimo de uma encosta, também voltado a Nascente. «Se as antas eram lugares para os mortos, os cromeleques eram lugares para os vivos, uma espécie de santuários onde se realizava o culto colectivo», explica Pereira Neves. Impressiona a vista do conjunto de menires dispostos em leque, formando uma espécie de anfiteatro.
O investigador posicionou-se no alinhamento do sol com as pedras e, explicou o significado da geometria das pedras. Depois demonstrou a existência de vestígios de um corredor em todo o perímetro do cromeleque. «Era um corredor de culto, por onde passavam pessoas e animais nas festividades», explicou o meticuloso Pereira Neves.
Falava o anfitrião no significado dos termos «Almendres» e «Pedras Talhas», quando chegou uma revoada de turistas franceses, que desceram de um autocarro. Uma guia parecia orientá-los na visita às pedras sagradas, mas logo Pereira Neves lhes foi ao encontro, expressando-se em francês e dispondo-se a explicar o necessário. Num ápice o grupo dispensou a guia, passando a seguir com redobrada atenção as cuidadas explicações do velho arqueólogo, que lhes indicava o significado do impressionante monumento, comparável com as enigmáticas pedras de Stonechenge e de Carnac na Ilha da Páscoa.
Deixámos o alto das Talhas e fomos observar o menir principal, disposto a algumas centenas de metros do cromeleque, por ter sido retirado, segundo o historiador, do centro do santuário, que era o seu lugar original.
Já de regresso a casa, cruzando a estrada, Pereira Neves confidenciou-me saber de um cromeleque que ainda não estava sinalizado, que uma vez descobrira nas suas explorações. E, não resistindo à ideia de me mostrar o achado, dirigiu-se pela estrada de Arraiolos, junto à qual o monumento estava implantado.
Imobilizou a viatura na berma da estrada e instou-me a segui-lo em busca do local. Porém uma rede de arame, recentemente disposta, cortou-nos o passo e o historiador de Sortelha anteviu o pior: «a mata parece ter sido limpa recentemente e eu não vislumbro as pedras, o mais certo é terem sido levadas por máquinas de rasto».
Desolado com o possível atentado ao património histórico, Pereira Neves dispunha-se a encetar a viagem de regresso, quando lhe sugeri que se poderia ter enganado no local, e talvez nada estivesse perdido.
Fomos mais adiante, «para descargo de consciência», como disse o historiador e arqueólogo, e quedámo-nos em local que ele considerou como provável ponto de acesso ao monumento. Embrenharmo-nos no mato e caminhámos até atingirmos um pequeno montado virado a Nascente, onde eu mesmo vislumbrei as silhuetas dos menires por entre os sobreiros. «Já vejo as pedras!», avisei. Pereira Neves concentrou o olhar no ponto que lhe indicava e exclamou comovido: «Felizmente!».
Este cromeleque era manifestamente inferior ao dos Almendres, ocupando uma área menor, embora mantivesse ao centro o grande menir. O investigador mediu distâncias a passo, tirou alinhamentos, apontou alguns pormenores, fixou pontos de referência e considerou ser urgente classificar este achado, para assim o salvaguardar. E prometeu que iria tratar disso.
De volta a casa, o notável escritor e historiador sabugalense era um homem satisfeito. Reencontrara as pedras que julgara perdidas e, assim disposto, contou-me histórias da suas constantes passagens pelo concelho do Sabugal, lamentando que a Câmara Municipal não tenha livros de sua autoria, nem para dar ao presidente da República quando visitou Sortelha a seguir ao incêndio do último Verão. «Encontrei-me recentemente com ele e ofereci-lhe o livro “Sortelha, Museu Aberto”, tendo-me ele afirmado que colecciona monografias e essa lhe estava em falta». «Descanse, Dr Pereira Neves, que ninguém é profeta na sua própria terra», aventei-lhe em ar de consolação.
plb
O post de José Carlos Lages intitulado «Pensamento do dia – É a obnubilação, estúpido!» conduziu-me a algumas reflexões sobre esse fenómeno histórico que tem influenciado os destinos da humanidade muito mais do que se pensa: a estupidez humana.
«Uma pessoa estúpida é aquela que causa um dano a outra pessoa ou grupo de pessoas sem que disso resulte alguma vantagem para si, ou podendo até vir a sofrer um prejuízo.»
Carlo M. Cipolla, As leis fundamentais da estupidez humana
Carlo Cipolla (1922-2000) foi um eminente e prestigiadíssimo historiador, especialista de história económica, que um dia surpreendeu os seus amigos com um livro a que chamou Allegro ma non troppo, no qual incluiu um estudo sugestivamente intitulado «As leis fundamentais da estupidez humana». Cipolla distingue a maldade da estupidez, considerando que esta tem sido causa de maior infelicidade que aquela.
A profundidade de análise que o conhecimento da anterioridade dá aos historiadores faz deles, frequentemente, pessimistas profissionais, relativamente às capacidades do homem para aprender com os erros do passado. Pelo contrário, o processo histórico parece ter contribuído para requintar o mal. A selvajaria, o vandalismo, o sadismo, tudo se tem apurado com o passar dos tempos. As carnificinas dos Romanos foram largamente ultrapassadas pelos suplícios medievais ou pelas torturas inquisitoriais. Esse verdadeiro monumento da crueldade humana que foi o tráfico de escravos dos séculos XV a XVIII parece quase uma brincadeira de aprendizes de carrasco quando comparado com os horrores nazis, ou estalinistas. O próprio Estaline dizia, aliás, que a morte de um indivíduo era uma tragédia mas a morte de um milhão era estatística.
Se o sofrimento humano fosse quantificável, mensurável, teríamos biliões de toneladas dele, ao longo dos milénios: pirâmides de mortos; multidões incontáveis de mutilados, de estropiados, de crianças esfomeadas, esqueléticas, de olhar inocente e suplicante; bandos de pedintes esfarrapados e pustulentos; milhões de deserdados sem eira nem beira, dormindo ao relento e vagueando aos Deus-dará por essas megalópoles desumanizadas, onde vale mais um cão de raça que um ser humano, onde se mata o próximo por dez réis de mel coado. Ó Céus! Que mundo construímos, depois de milhares de anos de civilização e de terem por cá passado Cristo, Buda, Confúcio e Maomé! Matamo-nos uns aos outros em nome deles!
São guerras nacionalistas, guerras de fronteiras, guerras de religião, guerras de máfias, guerras para vender armas, guerras para estimular a economia, guerras para… E, como dizia o Padre António Vieira, a Guerra é esse monstro que tudo devora.
Mas há mais e pior. Não contente com as guerras, pilhagens, saques, roubos e massacres com que tem infligido sofrimento aos outros e, com frequência, prejuízos a si próprio, o bicho-homem achou que ainda era pouco e resolveu encaminhar-se alegre e inconscientemente para o suicídio colectivo, numa espécie de harakiri universal. Vai daí começa a construir armas de destruição maciça, super-bombas de hidrogénio, acumulando um arsenal capaz de destruir várias vezes o planeta. E centrais atómicas, que são como que bombas-relógio produzindo continuamente lixo radioactivo, que sepultamos nas fossas oceânicas convencidos de que assim nos vemos livres dele. E pôs-se a lançar na atmosfera milhões de toneladas de dióxido de carbono, com que envolvemos o único planeta que temos, transformando-o assim numa estufa onde mais dia menos dia será impossível sobreviver. E arrasamos ou incendiamos todos os anos milhões de hectares de florestas, esses pulmões da Terra, que poderiam ir consumindo parte do tal dióxido de carbono mas que deste modo ainda produzem mais. E despejamos montanhas de lixo nas terras e nos mares. E envenenamo-nos uns aos outros com comida artificial, corantes e conservantes e vacas loucas. E engolimos hectolitros de estimulantes para ficarmos excitados e rios de nicotina para ficarmos calmos. E narcotizamo-nos, desde novinhos, com drogas «leves». E drogamo-nos, às vezes com a mesma idade, com ópios, morfinas, cocaínas e heroínas. E… e… Quase falta o fôlego!
Que é isto senão suicídio? E que é o suicídio senão o mais estúpido de todos os crimes, a agressão suprema contra nós próprios?
O cientista francês Henri Laborit demonstrou que a vida nas grandes metrópoles conduz fatalmente o homem a uma atitude agressiva, quer em relação aos outros quer em relação a si próprio: agredimo-nos quando roemos as unhas, ou quando fazemos úlceras de estômago, ou quando disparamos um tiro nos miolos. E agredimos os animais, as plantas, o ambiente, o planeta. Por isso ele defende como únicas alternativas para a humanidade o controlo da natalidade, a paragem do envenenamento da Terra e do esgotamento dos recursos naturais, particularmente da água, e, principalmente, o fim da miragem urbana. As megalópoles descomunais, com 20 ou 30 milhões de habitantes, como Tóquio ou a Cidade do México, são uma aberração social. Condenam inapelavelmente o homem à destruição de si próprio e do planeta. A solução reside no regresso às pequenas comunidades: muitas pequenas cidades em vez de poucas grandes cidades. A salvação está no verde, não no asfalto. Caso contrário, o abismo atrairá o abismo, até à explosão final.
Tudo isto parece desmedido, excessivo, ultrapessimista. É verdade, mas nos últimos tempos várias coisas nos têm obrigado a reflectir sobre os horizontes sombrios da Humanidade: são os novos e velhos fundamentalismos, as guerras, quentes ou frias, que param e recomeçam, as pazes que se fazem e se desfazem, os ódios que se atiçam, os profetas pseudomoralistas e cínicos que são como Frei Tomás, os abutres que se alimentam da desgraça alheia, os pedófilos que refocilam na miséria e na inocência, e tutti quanti…
Em suma: essa fatal aliança entre o mal e a estupidez humana.
«Na Raia da Memória», opinião de Adérito Tavares
ad.tavares@netcabo.pt
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